São Paulo: Estação Liberdade; Fundação Nestlé de Cultura, 1991. 74 p. “Primeiro lugar na categoria poesia – 5o. Prêmio Nestlé de Literatura Brasileira”
SOMBRAS E BORBOLETAS
Eu pego as sombras dos homens como se fossem borboletas. E então transformo todas em flores de estranha beleza. Perfumadas, lembram o jasmim seco, dos velhos túmulos onde a luz tarda a chegar. Como respiram, só Deus sabe. Suas pétalas têm movimento de asas, transparentes e ritmadas. Finas asas, vermelhazul. Brincam no ar, lépidas sombras a voar, ávidas, para o Sul. Como se fossem borboletas.
GERÚNDIO E INFINITIVO
Entender as solidões, escrevendo na ressaca de um mundo abandonado. Percorrer os labirintos, afastando as nostalgias mais persistentes. Acompanhar os jovens, titubeando como um fóssil de museu. Frequentar as boates, revivendo um estado de delírio perpétuo. Confundir os hábitos, fingindo não chamar as coisas pelo nome. Imitar os gatos, madrugando para as travessuras eróticas. Deslumbrar as visitas, ocultando a satisfação íntima da picardia. Surpreender os cactos, desabrochando numa adolescência magnífica. Valorizar as premonições, navegando num lago inviolável do coração. Traduzir as insônias, uivando sem rumo no povoado deserto.