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Expedição (2007)

Expedição

Do poeta como explorador

Todo poeta é, em alguma medida, um explorador do mundo que o cerca, já que o recria através de seu estro, e Davino Ribeiro de Sena vem assumindo essa condição de modo cada vez mais explícito. Depois de Três Martes, longo poema que extraía da astronomia e da mitologia seu motivo poético, Davino retorna à Terra em Expedição (7Letras, 2007), obra em que tematiza um importante momento da História do Brasil: a Expedição Langsdorff.

Liderada pelo barão Georg Heinrich von Langsdorff, médico alemão naturalizado russo, a expedição percorreu, na década de 20 do século XIX, vastas terras do interior do Brasil, então quase de todo inexplorado, coletando um valiosíssimo material etnográfico. Afirma Davino: Pensei então em acompanhar Langsdorff, cuja expedição deu a conhecer, como nunca antes, a beleza estranha da fauna e da flora, as paisagens e os povos da região amazônica. Mais do que uma obra histórica, este poema é uma obra de ficção [...] que apenas tomou como ponto de partida alguns relatos sobre aquela expedição, acrescentando personagens e cenas inventadas para compor a obra.

O tratamento dispensado ao motivo repete a proposta de Três Martes: a expedição é o acervo temático sobre o qual o poeta constrói um longo discurso poético, utilizando principalmente heptassílabos, como destaca Paulo Henriques Britto em seu excelente prefácio à obra. Davino Ribeiro de Sena trata, em Expedição, dos elementos fundamentais do lançar-se humano sobre a realidade que o cerca, experiência primeira neste encontro com o mundo que é a base de qualquer esforço civilizacional; estão lá, portanto, das origens do olhar científico. As etapas do conhecimento / cabem no gesto: este seixo, / isto é um seixo, o seixo é / branco, o seixo é duro, // o seixo é um corpo, / o seixo é um mineral, se eu / o lançar, ele cairá sobre a terra, / porque todos os seixos têm peso ao encontro com os outros homens, nos quais é reconhecida a alteridade: Dentes alvos fortes riam / da inabilidade dos brancos / de lidar com a nativa cor / na visita do chefe guató // recebido por Langsdorff / que suspeitava dos índios.

Se há alguma perda do rigor formal apresentado pelo poeta em livros anteriores, especialmente em Vidro e Ferro (1999), é preciso que se considere que não há expedição isenta de riscos; o que há de mais notável é a persistência de Davino em um caminho formal cujos obstáculos, que não são poucos, parecem cada vez melhor superados. Em relação a Três Martes, Expedição é menos digressivo, mais consistente com seus objetivos e melhor realizado esteticamente. Não se furtando aos percalços, Davino percorre bravamente as novas terras de seu lirismo: Expedição é um registro dessa árdua, mas necessária aventura poética.

Postado por Henrique Marques-Samyn